domingo, 26 de janeiro de 2014

Tempo de Antena

Querido diário,
Desde ontem que a minha colega de trabalho anda a causar-me alguma preocupação.
Dei-lhe boleia para o trabalho, não porque goste dela, mas tenho um carro novo e sou um grande cagão.
Pelo caminho, vimos um senhor a passear o animal de estimação.
Desatou-me aos gritos no carro "Olha que lindos que são os tomates daquele cão!".
Feita louca, esteve cinco minutos a imitar o balançar dos ditos enquanto trauteava uma canção.
Só parou porque lhe dei um chapadão.
Durante o resto da manhã, tudo o que ela dizia tinha a ver com colhão.
Ainda exemplificou, franzindo a cara, como ficam arrepiados os tomates dos homens antes da ejaculação.
Diz ela que tem saudades de senti-lo com a mão.
Descobri que ela não anda só com falta de sexo, ela precisa mesmo é que alguém lhe dê um valente fodão.
Descobri também que sou um poeta.

Guilherme, colega de trabalho da Snail.

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

Snail, a educar os portugueses com subtileza desde 1978

- Oh menina! Menina! Olhe, este sítio está muito mal organizado! Um gajo vem fazer um exame, até chega mais ou menos a horas e depois perde-se porque isto não está nada sinalizado, e anda aqui ao tio ao tio a perguntar onde isto se faz e ninguém sabe responder blá blá blá.

- Bom dia, antes de mais...

- Olhe, bom dia só se for para si. Eu já estou farto de andar aqui perdido. Veja lá se me sabe dizer onde se faz o exame, que já estou atrasado e como vocês não gostam muito de trabalhar, é a função pública que temos neste país, basta um gajo chegar atrasado uma hora e já dizem que não podem fazer o exame porque têm muitas marcações e blá blá blá.

- Eu posso tentar ajudar, mas sem saber qual é o exame não consigo...

- Está aqui escrito no papel! Tenho o papel virado para si desde que estou a falar consigo. É uma eco, mas escusa de me mandar para o sítio onde fazem as ecos ao coração que já lá estive e disseram que é noutro departamento. Agora, em vez de fazerem as ecos todas no mesmo serviço, que era mais fácil para toda a gente, têm as ecos separadas como se uma fossem mais importantes que as outras!...


 (Snail fofinha, suspira enquanto olha para a folha A4 que o senhor teima em abanar à sua frente)

- Ah! Essas ecos são feitas no piso de cima, onde se fazem as ecos às partes moles. Bom dia!


(Snail sorri e vai à sua vida. Ninguém manda o senhor ser mau para a Snail quando pede indicações para fazer um "eco peniano")

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

A diferença entre amar e não amar

Há muitos anos eu tinha namorado. Num domingo de sol, juntamente com o nosso grupo de amigos, bebemos umas cervejas a mais e ficámos ligeiramente embriagados. Estávamos de férias, algures na costa alentejana, havia mato com silvas, formigas e tabaco de enrolar. A felicidade era tanta, que eu e o meu namorado abraçámo-nos sem motivo, começamos a rodopiar devagar, até que terminámos de mãos dadas a rodar cada vez mais rápido, com as cabeças levemente inclinadas para trás e olhos fechados. Não me contive. Larguei-lhe as mãos e ele caiu de costas nas nas silvas. Eu achei giro, mas ele não. Uns meses depois acabámos. Chorei 1 dia.
Há 5 anos que tenho o meu portátil. No domingo passado, chovia lá fora e eu estava a ressacar no sofá. Numa súbita vontade de vomitar pela quarta vez, levantei-me a correr e o portátil voou. A bateria deixou de carregar, desde esse momento. Pensava eu que era do cabo e, mesmo de ressaca, saí de casa para comprar um novo. Não era do cabo. Não consigo dormir, não consigo comer e ainda não consegui parar de chorar.

quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Quão errado é desligar uma chamada na cara do chefe?

De todo errado, dirão vocês. 
Chefe é chefe e subalterno é subalterno. Se o chefe telefona ao subalterno é porque o chefe quer falar com o subalterno. E o facto de não ter nada de interessante ou pertinente a dizer, segundo os critérios do subalterno, não dá o direito ao subalterno a dar a conversa por terminada, nem sequer se invocar motivos de força maior, muito menos se desligar a chamada sem aviso. Ora, eu, que chefio algumas pessoas, por vezes estou aborrecida e ligo a um qualquer elemento dos patamares mais baixos da hierarquia profissional, apenas para ordenar que me digam que eu sou linda, para lhes perguntar o que estão a fazer ou para saber se não me querem trazer um café. Às vezes também ligo a fingir que sou dos recursos humanos a dizer que vão ser despedidos ou que foram destacados para inventariar corpos não identificados na morgue durante uma semana. Muitas vezes chamam-me atrasada mental ou desocupada, mas é com carinho. Outras vezes desligam sem dizer nada e eu volto a ligar para informar que não se desliga uma chamada na cara da chefe. Mas a minha vida não é perfeita. Eu também tenho chefes. Isso e o síndrome da juventude crónica, patologia gravíssima que se traduz clinicamente, entre outras manifestações de infantilidade, por crises sazonais de acne. Pois que hoje, quase todas as coisas erradas da minha vida se manifestaram, qual alinhamento cósmico do insólito. Acordei esta manhã cheia de sono e mau humor, e tudo piorou quando me olhei ao espelho antes do banho. Perfeita fusão entre a Diana Ross e uma estrela Bollywodesca, vi a minha cara rodeada pela minha farta cabeleira encaracolada e com uma borbulha roliça, fresca e de cor vermelho-rubi entre as sobrancelhas. Tive vontade de chorar, mas como já estava atrasada, fui tomar banho, vesti-me e saí de casa. Ainda mal tinha ligado o meu computador no trabalho, quando o meu chefe telefona para falar sobre papéis e toalhetes. Num acesso de simpatia matinal, perguntou a certa altura se eu estava 'bem dispostinha'. Cabisbaixa, respondi que estava mais ou menos.... "Acordei com uma borbulha gigante entre as sobrancelhas...", disse-lhe desanimada. Ele riu-se, simpático, e respondeu "E consegue andar...?". Nem deixei que terminasse a pergunta, respondi rápido, a explicar um detalhe importante nesta história emocionante, mas não tão emocionante como a que eu achava que ele estava a ouvir. "Entre as sobrancelhas! So-bran-ceeeeeeeeee-lhas!!!". Calmamente, respondeu-me: "Sim, querida... eu percebi onde era. Só ia perguntar se, vaidosa como eu a conheço, consegue andar assim na rua....".
Sim, meus queridos, às vezes está certo fingir que se ficou sem rede, que a bateria do telefone foi-se, que parte do edifício evaporou ou que se teve morte súbita e simplesmente ficar-se mudo de vergonha durante dez segundos para depois desligar a chamada ao chefe sem aviso.

domingo, 5 de janeiro de 2014

Comunicado

Não tenho a certeza se já disse isto aqui, mas nunca é demais reforçar: a sabedoria dos nossos velhos é de uma riqueza inestimável. Muitas vezes, quando vou passar o fim de semana lá na minha casa de campo, vulgo casa dos meus pais na terra que me viu crescer, o meu pai conta a história de uma noitada nas festas de uma terra vizinha. Naquele tempo, ele conduzia uma mota Famel e não usava capacete. Conta-me esta parte para me explicar que eu levo muitas coisas dentro da mala e que, depois de beber uns copos a mais, corro o risco de perder artigos de valor. Naquele tempo, ele deixava a mota em casa e ia de autocarro ou comboio para as festas das outras terras. Conta-me esta parte para me relatar a alegria de uma noite de festa, o que inclui a ida e a volta, que no autocarro iam todos juntos e podiam rir das palhaçadas uns dos outros no regresso, coisa que não podia acontecer na Famel porque só restava lugar para mais um e isso era um grande risco, porque se o outro tivesse bebido demais podia vomitar-lhe a cabeça e ele ia sem capacete. Naquele tempo, ele comprava logo bilhete de ida e volta porque depois de beber duas cervejas já não sabia fazer contas e corria o risco de não ter como voltar para casa. Conta-me isto e acaba sempre a contar a noite em que só tinha bilhete de ida, os amigos já tinham ido embora mas ele quis ficar na festa até fechar a última tasca e, sem ninguém para lhe emprestar dinheiro nem para lhe dar boleia, acabou por adormecer encostado a uma árvore e só acordou quando um cão vadio lhe mijou nas pernas e que depois teve de fazer 5 km a pé. Depois disto, entre sorrisos saudosos e suspiros ao relembrar os seus gloriosos tempos de juventude, termina o seu discurso a explicar-me que devemos sempre sair da festa enquanto ela ainda está a ser boa, pois assim só guardamos boas recordações. "E assim deve ser tudo na vida..." - diz-me ele a enrolar as pontas do bigode grisalho -"... se já não te dá gozo, se já te faz dores de barriga, se já te faz sono, se já te faz ficar aborrecida a pensar que já foi bom, segue para outra coisa. Tudo tem o seu tempo e cada um tem o seu." 
E é isso que vou fazer. 


Por aqui, declara-se oficialmente encerrada a festa de Ano Novo.


quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Snail, a apimentar os relacionamentos dos outros desde os finais de 2013.

Este ano tive uma passagem de ano diferente. Entre emigrações e novos namoros, o grupo do costume dissipou-se em escolhas diferentes para a noite de ano novo, pelo que acabei por passá-la com uma amiga de guerras antigas. Pessoa que partilha comigo o gosto pela vida boémia, teve uns aninhos de ausência devido a uma relação séria. Relação essa, que começou numa de tantas saídas nocturnas e que terminou recentemente. Enquanto combinávamos o plano para o jantar da 'grande noite do ano', que se realizou na minha casa, ela pediu-me se podia trazer um amigo e uma amiga. Disse que sim, claro, quantos mais melhor. E qual não é o meu espanto quando os três chegam e eu reparo que o amigo é uma antiga paixão dessa minha amiga. Entre olhares subtis, percebo que há ali qualquer coisa a rolar, consigo perguntar entre dentes, ela cora e diz um tímido 'ainda não'. Fiquei feliz pela minha amiga. Eles entram, despem os casacos e de imediato faço a apresentação da casa. Assim que mostro o quarto, a minha amiga exclama com voz trémula e emocionada ''Ah!!! A tua cama! Saudades da tua cama!''. Naqueles tempo em que saíamos juntas, ainda eu morava num T0 em que aquela cama era a maior peça de mobília da minha casa, e as noites terminavam religiosamente com o pessoal todo ao monte sentado na cama a comer massa com atum e a rir até adormecermos um para cada lado. Eu rio-me com cumplicidade, mas segundos depois reparo no ar desconfiado do 'amigo'. Tento salvar a minha amiga. 

Posto isto, e antes de continuar com esta linda história de amizade, vou só ressalvar alguns pontos importantes que podem facilmente identificar na breve nota introdutória do monólogo que se segue. Eu sou uma pessoa boa. Eu não me esqueço dos meus amigos. Eu aceito que eles voltem à minha vida. Eu sou generosa. Eu aceito receber pessoas novas em minha casa, só para garantir o bem estar de todos. Eu sou uma heroína. Eu dou o peito às balas para salvar as pessoas de quem gosto. A vida não é justa.

- Ela já conhece a minha cama...
Amigo continua desconfiado.  
- Oh, que cara é essa? Ela está assim porque já foi muito feliz aqui...
Amigo mostra-se desconfortável.
- Epá, calma! Ela esteve na minha cama, mas eu também estava!
Amigo arregala os olhos num misto de sensação de facada no peito e excitação sexual.
- Epá, isto agora soou mal, não foi? Não interpretes isto mal! Eu estava na cama com ela com ela, mas também estavam mais pessoas...
Amiga puxa amigo pelo braço, faz cara de má e manda-me calar. 

Ah, a ingratidão...